domingo, 17 de abril de 2011

SAMBETO DE UMA NOITE SÓ

Dentre coloridas silhuetas, lha vi crua


Pobrezinha, chorando só, vazia mesa

Minha face borrada, sem classe – fez-se nua

Rezei discreto, clamei quieto sua beleza



Porque a moça que [sentada] ali sofria

Da noite dos meus sentidos ordenou dia

Sem contudo o galo [um contato] ‘inda cantara

Tampouco o sol, olhos para mim, desse as caras



O encanto que escorria em suas lágrimas

Eram frases preenchendo tantas páginas

- Folhas d’um livro d’insultuosa dor

Que eu queimaria em intenso fogo [meu amor]



Parei diante dela. Viu-me o vulto

Perguntei-lhe, rubro, se queria conversar

Questionou-me, só por dizer, “mas que assunto?”

Respondi-lhe: “Sei lá, reis, ministros, algum czar!”



Ela então, curiosa, olhou para cima

E seus olhos se esbarraram nos meus

Não há, doutor, rima que exprima

Nem prosa, aquilo que se deu:



Virei pierrô em noites de bandalheiras

Ela, estrelas, brilhava como tais

Nascente paixão sem eira nem beira

Pularia, imensa, mais de mil carnavais



Rei e rainha, deslizávamos pela pista

Eu bebia os suspiros dos seus lábios

Fomos prima-obra d’um Bom Artista

- Criação acabada. Ligado o rádio:



Sinfonias inebriantes que vinham

Escorregando pela noite inocente

Acordes s’inventavam, logo sumiam

Da magia que embebedava a gente



Para meu orgulho, seu moço, era a mais bela

Vermelha boca, castanhos olhos felinos

Que o menos crente, fraco, se estatela

No chão do absurdo, seu rosto lindo



Os minutos corriam mais que nossos pés

E nós, loucos, fazíamos rodízio d’humores

Invadíamos pares e belos quadros, ao invés

De só sentar, beijar em sonho, mastigar flores



O amanhecer [que ódio!] veio tão cedo

E ela, no portão do baile, olhou pra trás

E em não a rever, fez-se em mim tanto medo

Gritei: “Ei, moça, não te verei mais?”



Ela sorriu, sacudiu os ombros destampados

Eu pude vê-la, não um anjo, mas mulher

“Espera o destino; se ele acaso quiser...”

Chorei então torto, gargalhei errado



Porque a moça que [partiu!] dali não se via

Não sabia, distraída, o que portava:

Levara consigo minha mais minha fantasia

O Romeu, até então hiberno, despertara



O caminho lá pra casa demorou tanto

De repente não seria lá o meu final

A beleza viva da rua morta causou-me espanto

Era amor ou só encanto de carnaval?



tic-tac tic-tac tic-tac… cuco – cuco – cuco três da tarde



Esgotado da ternura do seu cheiro, então dormi.

Minhas mãos acordaram ainda em perfume

Na lembrança dela, sua ausência, daí sofri

Pois foi ela em minha noite escura, mil vaga-lumes

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